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Parabéns, Jornal A Voz da Serra!

quinta-feira, 13 de abril de 2023

O jornal A VOZ DA SERRA é uma voz que não se cala há 78 anos. Comparece, diariamente, expondo a vida da cidade em suas páginas, mostrando os desafios e as conquistas do povo das montanhas friburguenses. Não deixa de comentar os fatos, colaborar com as dificuldades e enaltecer as qualidades das realizações concretizadas em cada lugar da região.

O jornal A VOZ DA SERRA é uma voz que não se cala há 78 anos. Comparece, diariamente, expondo a vida da cidade em suas páginas, mostrando os desafios e as conquistas do povo das montanhas friburguenses. Não deixa de comentar os fatos, colaborar com as dificuldades e enaltecer as qualidades das realizações concretizadas em cada lugar da região.

Sem timidez e com coragem, suas páginas levam a informação com objetividade, ética e retidão, demonstrando em cada palavra o amor ao solo sobre o qual fincou suas raízes. Mas não era para menos. Depois de vicejar como uma grama pequena, num tempo pós-guerra, quando o mundo estava sofrido por tantas tragédias, o jornal cresceu, sobrevivendo a grandes e pequenos obstáculos.

É preciso comemorar o seu empenho em suas vitórias diárias. Seus guerreiros, os jornalistas, os colunistas, os administradores e funcionários trabalham com disposição, lutam para que sua a voz, feita de palavras escritas, circule de esquina em esquina, de bairro em bairro, de região em região.

No último dia 7, quando comemoramos seu aniversário, percebemos o resultado do sonho dos seus fundadores. Tenho a honra de participar dele porque também, como todos os envolvidos no fazer jornalístico, contribuo para a melhoria da qualidade de vida da cidade.

Além do mais, é enriquecedor estar presente na vida de A VOZ DA SERRA, uma vez que as pesquisas, os fatos investigados e apresentados em suas colunas engrandecem nossos modos de perceber a vida e interagir.

Deixo aqui registrado o meu desejo de vida longa ao nosso Jornal.

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A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.

A pior decisão

segunda-feira, 03 de abril de 2023

Noutro dia, emprestei “Meu Amigo Pintor”, de Lygia Bojunga, autora brasileira de literatura, a um estudante de Ensino Médio. Eu a reverencio pelo entendimento que possui da vida e das relações humanas, pela habilidade que tem para criar histórias verossímeis, sendo capaz de tocar o leitor de todas as idades e culturas, pela linguagem simples, sensível e objetiva que utiliza em cada um dos seus textos.

Noutro dia, emprestei “Meu Amigo Pintor”, de Lygia Bojunga, autora brasileira de literatura, a um estudante de Ensino Médio. Eu a reverencio pelo entendimento que possui da vida e das relações humanas, pela habilidade que tem para criar histórias verossímeis, sendo capaz de tocar o leitor de todas as idades e culturas, pela linguagem simples, sensível e objetiva que utiliza em cada um dos seus textos.

Já na 24º. edição e traduzido para várias línguas, “Meu Amigo Pintor” é uma obra construída com mestria e sensibilidade que aborda a afetiva amizade de um menino de onze anos por um pintor que enfrenta a depressão, situações dolorosas e decide não mais viver.

O suicídio é uma decisão particular, consciente e corajosa, através da qual uma pessoa coloca um ponto final na vida. Quem já não passou por momentos em que se questionou sobre o próprio viver e morrer?  Em alguns momentos olhei para o suicídio quando uma dor imensa tomou conta de mim e a sensação de fracasso invadiu minha visão de futuro. Confesso que foi um dos enfrentamentos mais difíceis que tive. Por sorte, foram superados pela força da vontade de não findar quando um encorajamento inaugurava o momento seguinte.  

Certa vez, escrevi o conto “Na beira, sem eira” em que, numa madrugada, falei do que não realizei por não ter conseguido ou não ter tido coragem, além de perceber o tempo levando embora meus sonhos. Foi bom tê-lo escrito como forma de reavivar alguns dos meus propósitos.  

A vida está longe de ser uma aventura perfeita, é construída em campos a serem lavrados com trabalho e sonhos, perdas e ganhos, lutas finitas e infinitas. Onde tudo pode acontecer e, também, não ser realizado.  

Algumas vezes escutei frases que me ficaram guardadas e, volta e meia, adentram o baile dos meus pensamentos: “É mais fácil morrer do que viver”. “Com a morte tudo acaba, porém, mantendo a vida, tudo do que queremos fugir continua a nos desafiar”. “A grande felicidade é estarmos aqui, inteiros e vivos.” 

Vale a pena ler o livro de Lygia Bojunga para se notar o quanto é difícil perder alguém de quem se gosta, principalmente uma criança e um jovem, por ter desistido da vida; o suicídio não é uma morte natural. A questão que surge para mim, não é somente terminar com a vida, mas a dor e a incompreensão que o fato causa em outras pessoas. E, o pior, é o exemplo funesto que a pessoa deixa para todos. 

A vida não pode ser pendurada em paredes, mesmo quando se perde uma perna ou quebra-se um braço. É para ser experimentada até o último instante e é aí, nesse enfrentamento, que a coragem vai brotando como uma rama tímida. Ao terminar de escrever “Sem eira, nem beira”, um raio de sol despontou na minha sala, e, então, esta sensação, despontou um mim com grandeza e nitidez.

Como disse minha personagem Zuleica, a mosca cor de rosa choque, em “Um cão cheio de ideias”.

“Vida, vida bela

A gente não pode estragar ela

Lá! Lá! Lá!”

 

Observação: Lygia Bojunga é ganhadora do Prêmio Hans Christian Handersen e do Prêmio Memorial Astrid Lindgren.

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As formigas e as flores do manjericão

segunda-feira, 27 de março de 2023

Noutro dia, de manhã, com resto de sono guardado no corpo, fui jogar o lixo na lixeira, que fica ao lado do canteiro onde estão plantados pés de manjericão. Ao me abaixar vi uma fileira de formigas carregando pequeninas flores brancas caídas no chão, algumas quase do tamanho dos insetos que as transportavam incansavelmente. Como estava relaxada e com a hora sem estar contada, fiquei as observando com admiração, pensando no trabalhador braçal, na minha família composta por pessoas que dedicaram anos e anos ao trabalho; minha avó foi enfermeira de posto de saúde e minha mãe bibliotecária.

Noutro dia, de manhã, com resto de sono guardado no corpo, fui jogar o lixo na lixeira, que fica ao lado do canteiro onde estão plantados pés de manjericão. Ao me abaixar vi uma fileira de formigas carregando pequeninas flores brancas caídas no chão, algumas quase do tamanho dos insetos que as transportavam incansavelmente. Como estava relaxada e com a hora sem estar contada, fiquei as observando com admiração, pensando no trabalhador braçal, na minha família composta por pessoas que dedicaram anos e anos ao trabalho; minha avó foi enfermeira de posto de saúde e minha mãe bibliotecária. Também pensei no meu trabalho, agora voluntário, na Academia Friburguense de Letras. E lá continuavam as formigas, numa marcha infinita e em pacífico silêncio, sob o sol que começava a esquentar. Resilientes e firmes, cumpriam suas obrigações.

Incrivelmente, à noite, uma cigarra adentrou minha sala. Agitada e só, ia se debatendo pelas paredes e cúpulas de abajur, fazendo barulheira. Cada vez mais desesperada, o inseto cantava alto. Fiquei agoniada tentando salvá-la, mas ela voava e cigarreava. Fechei as luzes e abri as janelas. Não a vi sair. No dia seguinte de manhã, fiz uma busca minuciosa pela casa e não a encontrei. “Ufa, ela deve ter reencontrado a liberdade”, suspirei aliviada. 

Fui caminhando dia afora refletindo sobre a fábula de Esopo, “A cigarra e a formiga”, adaptada para o francês por La Fontaine, as formigas carregando alimento em procissão divina e a cigarra atordoada fora do seu habitat e enfrentando paredes. Cheguei à conclusão que o mundo precisa de cigarras e formigas. As formigas são trabalhadoras, organizadas e trazem grandes benefícios para a natureza. As cigarras fazem parte da cadeia alimentar e são consideradas pragas para algumas culturas. Ah, as diferenças individuais e os valores presentes em cada pessoa... quem é semelhante a alguém?

Esopo foi genial ao contar que a cigarra foi acolhida pelas formigas para diverti-las através da dança ou cantoria. Imaginem se as formigas não abrissem a porta para a cigarra entrar e cantar durante o inverno, tempo em que elas deveriam ficar reclusas?

Nem lá com as formigas, nem cá com as cigarras. Não estamos inseridos num universo multifacetado de realidades distintas? O importante é que façamos a vida acontecer com criatividade. 

E o manjericão?

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As pérolas dos introvertidos

segunda-feira, 20 de março de 2023

Os extrovertidos possuem capacidade de apresentação, podendo, inclusive, transparecer empoderamento; geralmente são bons oradores e se expressam com desenvoltura. Muitas vezes são evocados como bem-sucedidos e reconhecidos como líderes. 

E os introvertidos?

Os extrovertidos possuem capacidade de apresentação, podendo, inclusive, transparecer empoderamento; geralmente são bons oradores e se expressam com desenvoltura. Muitas vezes são evocados como bem-sucedidos e reconhecidos como líderes. 

E os introvertidos?

Estou lendo o “Poder dos quietos - como os tímidos e introvertidos podem mudar um mundo que não para de falar”, escrito por Susan Cain, 2012, GTM Editores Ltda, e sinto-me tocada pelo conteúdo. Mesmo tendo formação humanista, sendo educadora e escritora, sempre fui influenciada pela cultura ocidental, na qual estou mergulhada, que subestima as capacidades e qualidades dos introvertidos. 

Depois de abdicar da carreira de advogada e consultora, Susan engrandeceu sua quietude e tornou-se escritora e pesquisadora, especialmente nos temas relacionados à mulher, bem como ao modo de ser das pessoas introvertidas. Como uma forma de se aprofundar seus conhecimentos a respeito, ela começou a fazer uma pesquisa extensa em 2005, conversando e trocando mensagens com “centenas, talvez milhares de pessoas”, conforme relata no início da obra, lendo livros, reportagens e artigos acadêmicos, acompanhando discussões em chats e blogs.

O introvertido aprecia o estado de solitude em que experimenta a privacidade.  Será a quietude uma bravura? Ou uma característica pessoal na qual a pessoa, por uma decisão pessoal, estabelece o contato consigo, tendo a oportunidade de fortalecer o amor-próprio e a autoconfiança. Muito diferente do estado de isolamento ou reclusão causados por algum sofrimento e outros motivos independentes ou não da própria pessoa.  

A cultura ocidental cultua a personalidade extrovertida, aquela que gosta de correr riscos através de situações ousadas, que desafiam o cérebro e o corpo em vários sentidos. É uma personalidade importante e saudável a quem naturalmente a possui.

Os introvertidos e extrovertidos têm atraído a atenção de cientistas, psicólogos, filósofos e outros estudiosos nas Ciências Humanas. São dois estilos de personalidade distintos, como são o masculino e o feminino. A influência da cultura ocidental em favor dos extrovertidos corrobora para que o introvertido perca a noção de quem realmente é. O que causa, no quotidiano, uma série de transtornos emocionais. A introversão e a extroversão são modos de ser espontâneos e estão presentes em todo o reino animal.

Cientistas, como Einstein e Newton, músicos, como Chopin, escritores, como Sir. James Matthew Barrie, autor de Peter Pan, os pintores, como Van Gogh, foram pessoas introvertidas que comunicaram suas riquezas interiores e muito beneficiaram o mundo. 

Desde cedo, a criança convive com estímulos que valorizam as atividades em grupo, as estrelas da música e do cinema, o sucesso profissional, o excelente relacionamento interpessoal, a exposição pessoal. Mas quem é introvertido sofre com o preconceito contra os quietos, das formas mais sutis e veladas, inclusive. Algumas vezes são vistos como preguiçosos, lentos, chatos, esquisitos. Outras, são vulneráveis ao bullying. Podem ser até considerados problemáticos.  

A questão não é sair da concha, é saber estar nela e aproveitar suas riquezas. Para finalizar, eu me dou o direito de afirmar que aprender a ser é um dos maiores talentos que a pessoa possa ter. 

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Enquanto a mulher acontece...

segunda-feira, 13 de março de 2023

Enquanto uma mulher nasce, o orvalho umedece a noite, pombos voam, tenistas entram nas quadras, cozinheiros descascam legumes, aviões decolam, brotos despontam nos galhos das orquídeas.

Enquanto uma mulher amamenta, galinhas chocam ovos, come-se saladas nos restaurantes, alunos chegam nas escolas, pessoas saboreiam sorvetes, escritores escrevem livros, eletricistas consertam a fiação das ruas, padeiros fazem pães.

Enquanto uma mulher nasce, o orvalho umedece a noite, pombos voam, tenistas entram nas quadras, cozinheiros descascam legumes, aviões decolam, brotos despontam nos galhos das orquídeas.

Enquanto uma mulher amamenta, galinhas chocam ovos, come-se saladas nos restaurantes, alunos chegam nas escolas, pessoas saboreiam sorvetes, escritores escrevem livros, eletricistas consertam a fiação das ruas, padeiros fazem pães.

Enquanto uma mulher chora, folhas secas caem das árvores, ventos derrubam ninhos de passarinhos, cachorros latem raivosos, canto das corujas invade a madrugada, lâmpadas queimam, borboletas lutam contra os vidros.

Enquanto uma menina-mulher descobre o amor, amigos se abraçam, vagalumes iluminam as noites, feirantes vendem maçãs, casais se deitam nas camas, trabalhadores voltam para casa, telefones tocam, bebês brincam com as mãos, namorados se beijam.

Enquanto uma mulher se torna adulta, crianças correm nas praças, médicos atendem pacientes em hospitais, calçadas ficam cheias de transeuntes, trens deslizam sobre os trilhos, ladrões são presos, garças ciscam na beira dos lagos, o sol desponta nos horizontes.

Enquanto uma mulher adoece, idosos tropeçam, chaves são perdidas na rua, motoristas ficam estressados nos engarrafamentos, mentiras são ditas, sapatos apertam os pés, mendigos pedem esmolas, estrelas se escondem atrás das nuvens.

Enquanto uma mulher aprende a falar e a andar, tenores cantam óperas, baleias azuis nadam em busca de alimento, navios de carga atravessam oceanos, velhos exercitam as pernas, carros trafegam nas estradas, professores ensinam matemática, ciclistas sobem trilhas nas montanhas.

Enquanto uma mulher se sente humilhada, raios cortam horizontes, desconfianças invadem ambientes de trabalho, ninguém pede perdão, a ingratidão encontra reinado nas cidades, brigas desintegram famílias, crianças machucam os joelhos.

Enquanto uma mulher engravida, circenses montam a lona dos circos, impressoras fazem cópias de documentos, dentistas tratam de cáries, elefantes se banham nos rios, onças brincam com seus filhotes, meninos jogam futebol, manicures cuidam das unhas de seus clientes.

Enquanto uma mulher amadurece, adolescentes choram, gatos miam, macacos pulam de galho em galho, chove, primaveras chegam, esportistas colocam gelo nas contusões, pessoas andam apressadas na rua, cortinas dos palcos são abertas, músicas são ouvidas ao longe.

Enquanto uma mulher envelhece, aviões desligam os motores, cachoeiras lavam as pedras com espumas, moinhos são movidos pelas águas, ônibus partem das rodoviárias, anoitece.

Enquanto uma menina adolesce, leitores pegam livros em bibliotecas, bailarinas deslizam nos palcos, beija-flores sugam o néctar das flores, ondas estouram nas praias, minhocas fazem buracos na terra, homens entram e saem das estações de metrô.  

Enquanto uma mulher morre, despedidas tomam conta dos aeroportos, amigos dizem adeus, chega a hora dos filhos saírem de casa, malas de viagem são fechadas, bilhetes são deixados em cima das mesas, salas ficam vazias à noite, há silêncio nos quartos. 

Enquanto uma mulher pinta as unhas, meninas pulam corda, malabaristas vestem fantasias, batons vermelhos são vendidos, perfumes são presenteados, cartas são escritas. 

Enquanto uma mulher perde a esperança...

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Quais segredos guarda o advérbio também?

segunda-feira, 06 de março de 2023

Vocês devem conhecer aqueles momentos em que buscamos o que assistir na televisão quando surge algo que nos interessa. Pois bem, isso aconteceu noutro dia quando escutei alguém comentar sobre o “também”, dizendo que o advérbio tem inúmeros sentidos, não somente aqueles mais conhecidos, como dando ideia de inclusão, equivalência e comparação.

Vocês devem conhecer aqueles momentos em que buscamos o que assistir na televisão quando surge algo que nos interessa. Pois bem, isso aconteceu noutro dia quando escutei alguém comentar sobre o “também”, dizendo que o advérbio tem inúmeros sentidos, não somente aqueles mais conhecidos, como dando ideia de inclusão, equivalência e comparação.

Eu me pus a pensar a respeito até porque é uma palavra que, volta e meia, sinto dúvidas quando a emprego ao escrever. Certamente, todo o texto, mesmo os não literários, tem riqueza de significados. Basta ler com atenção e refletir sobre as circunstâncias em que foi escrito, observar os modos com que está contextualizado nas situações, sejam reais ou ficcionais, que captamos mensagens, algumas das quais instigantes ou com duplo sentido. 

Será o advérbio um anarquista? Afinal de contas é aquela palavra que muda tudo, dando um sentido ao verbo, ao adjetivo e a ele mesmo. Inclusive a uma frase. Os advérbios guardam segredos. Fui percebendo, ao longo da pesquisa e refletindo sobre como escrevo, que, muitas vezes, uso o “também” para mostrar algo secundário. É importante ter ciência do que quero dizer. 

Mesmo fazendo comparações, inclusões ou equivalências, o termo a que me refiro ao “também” está em segundo plano. Ou seja, a referência que vem a seguir está em posição secundária. E, ainda, pode guardar o sentido de intrusão. Nunca havia pensado a respeito, e aquela passada rápida por canais me foi instrutiva.

Atribuímos valores a tudo. Para nossa saúde física e mental, precisamos reconhecer o grau de importância das situações para que possamos avaliar e decidir.  Também refletir sobre as consequências das nossas opções que, a meu ver, é a etapa do “também”, a secundária.

Vou passar o dia a pensar nas coisas da minha vida que preciso colocar no plano do também. Será que vou conseguir reordenar tudo aos quase setenta anos? Será que vou, também, precisar de mais tempo? 

Ainda bem que fiz a limpeza dos pés ontem...

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E por que não tapar os buracos da sola daquele sapato que nos calça os pés tão bem?

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Ontem, conversando com mamãe e uma amiga dela, ambas longevas, falamos que o ano começa depois do carnaval. Olhei para as duas, que tinham mais de oitenta anos, minha mãe, 91, e vi que ambas estavam empertigadas, olhando para os dias futuros com altivez. O momento ficou na minha cabeça, sendo embalado pela melodia de Ivan Lins, “Começar de Novo”. Com uma letra forte e poética, a música fez grande sucesso quando foi lançada em 1979 pelo grito de enfrentamento ante as situações difíceis da vida conjugal que desencadeiam a separação. 

Ontem, conversando com mamãe e uma amiga dela, ambas longevas, falamos que o ano começa depois do carnaval. Olhei para as duas, que tinham mais de oitenta anos, minha mãe, 91, e vi que ambas estavam empertigadas, olhando para os dias futuros com altivez. O momento ficou na minha cabeça, sendo embalado pela melodia de Ivan Lins, “Começar de Novo”. Com uma letra forte e poética, a música fez grande sucesso quando foi lançada em 1979 pelo grito de enfrentamento ante as situações difíceis da vida conjugal que desencadeiam a separação. 

Hoje, mais de 40 anos depois, vejo que a primeira estrofe pode ser aplicada a qualquer situação. Ora pois, os caminhos que trilhamos ao longo dos anos não são desafiadores? Às vezes até chegamos a suspirar ao pensar o que temos pela frente. Como Carlos Drummond de Andrade sabia disso quando escreveu o verso “No meio do caminho tinha uma pedra”, primeira estrofe do poema “No Meio do Caminho”. 

Em “Começar de Novo” os versos iniciais nos acionam a recomeçar a viver dando as mãos e abrindo os braços para nós mesmo. Mostra-nos que vale a pena poder continuar a providenciar os meios para pagar as contas, cuidar da casa, da família e dos amigos, enfrentar os problemas de saúde. Dos animais de estimação. E por que não tapar os buracos da sola daquele sapato que nos calça os pés tão bem? É apaziguador reconhecermos a força que temos para resolver problemas, realizar novos sonhos e mudar o rumo das coisas.

O Dr. Jadyr de Araújo Goes, médico psiquiatra, amigo do meu padrasto, também médico, sempre que conversávamos, o que acontecia com frequência, me dizia que o corpo e a mente precisam de movimento, que todas as células são pulsantes e nos alicerçam. Ainda enfatizava que cada dia deve ser encarado como o mais importante de todos porque a vida é única e finda.  O tempo não nos cede um segundo sequer; é rigorosamente inflexível, dentro do qual envelhecemos, mesmo que nossas mentes mantenham a esperança da juventude.

 Acordamos para um dia novo e diferente, nada se repete, mesmo na mais enfadonha rotina. No caminho da casa da mamãe para minha casa, olhando para as ruas, os carros, os pedestres, os cachorros, repentinamente, parei e me perguntei: “Por que olho para fora e não para dentro da minha pessoa?” Aí uma senti fome imensa de mim, uma vontade de eu mesma me degustar para sentir o gosto que tenho neste momento de existência, quando estou perto dos setenta anos. Cheguei em casa e fiquei só, em total estado de privacidade. Sem me sentir isolada e reclusa, deixei a vontade de estar comigo ter dominância sobre aquele momento.

“Começar de novo e estar comigo. Vai valer a pena ter amanhecido”.

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Cada um deve cuidar das suas moscas depois do carnaval

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Hoje é tempo de trilhar caminhos do imaginário para recomeçar o ano, depois da grande festa que veio de longe e de longo tempo, tomou conta das cidades do Brasil, transformando os dias em movimento, liberdade e criatividade. Quando o povo, sem timidez e com abundante energia, se jogou na folia, brindou a vida com festejos barulhentos e ritmados. Quando as pessoas se permitiram ser elas mesmas e não as serem! 

“Naquele carnaval, pois, pela primeira vez eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.”

Hoje é tempo de trilhar caminhos do imaginário para recomeçar o ano, depois da grande festa que veio de longe e de longo tempo, tomou conta das cidades do Brasil, transformando os dias em movimento, liberdade e criatividade. Quando o povo, sem timidez e com abundante energia, se jogou na folia, brindou a vida com festejos barulhentos e ritmados. Quando as pessoas se permitiram ser elas mesmas e não as serem! 

“Naquele carnaval, pois, pela primeira vez eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.”

               Clarice Linspector, em Felicidade Clandestina

 

O que me chama a atenção no carnaval é que além de produzir grandes festas, são dias do nós. Seja nas cidades ao som dos batuques e na dança dos pés, seja na praia diante da beleza do mar ou nos braços do campo, tivemos um tempo em que se compartilhou a descontração e as sensações que não há em outros dias do ano. De alguma forma há sempre a vontade de se encontrar o mais impossível possível que cada um guarda em si. 

Custei a compreender que fantasia/ É um troço que o cara tira no carnaval/ E usa nos outros dias por toda a vida”

Aldir Blanc e João Bosco, em Fantasia

 

Desfilou-se junto de foliões, descansou-se ao lado de pessoas de quem gostamos, divertiu-se com quem nem conhecemos. De todos os modos, o que se fez nos dias de carnaval ficou preservado nas lembranças leves ou neuróticas, ajustadas ou desconcertadas, felizes ou ilusórias. Esse carnaval, mais uma vez, nos mostrou que a “vida é bela”, conforme disse a Zuleica, a mosca cor-de-rosa-choque, personagem do livro “Um cão Cheio de Ideias”, de minha autoria.

Meu fumo e minha yoga/ Você é minha droga/ Paixão e carnaval/ Meu zen, meu bem, meu mal”

                                           Caetano Veloso, em Meu bem, meu mal

 

Será que as máscaras que os foliões usaram no carnaval foram mais criativas das que usam na vida diária?  Usam-se tantas, que, às vezes, pode-se pensar que o carnaval acontece em todos os dias do ano. Ora pois, não somos personagens que criamos com tamanha convicção que chegamos a pensar que os somos? Todavia as máscaras são importantes para nossa sobrevivência no universo civilizado para afastar, para não dizer espantar, pessoas que não nos fazem bem e que fazem nosso “eu profundo”, como apontou Fernando Pessoa, ficar tão distante. Quem ainda não experimentou lúcidas mentiras?

“A vida é uma tremenda bebedeira./  Eu nunca tiro dela outra impressão./ Passo nas ruas, tenho a sensação/ De um carnaval cheio de cor e poeira.

(...)

Só é decente ser outra pessoa/ Mas isso é porque a gente se vê por fora.../ Qualquer coisa em mim parece agora

Alberto de Campos (Fernando Pessoa), em Carnaval

 

Depois do carnaval, cada um volta à sua rotina, é o agora que vamos poder realizar. Entretanto, amigo leitor, se fazendo contas, cuidado da casa e do corpo, trabalhando em casa ou escritório, não deixe de cuidar das suas moscas!

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Escritores com veias científicas afloradas e cientistas com veias literárias manifestas

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Não tive como deixar de dar continuidade à coluna anterior pelas questões que não me deixaram aquietar, principalmente depois que José Huguenin, autor do livro “Vidas Sertanejas”, me enviou o texto de João Zanetic, “Física e literatura: construindo uma ponte entre as duas culturas”, publicado no livro “História, Ciências e Saúde – Manguinhos”, publicado pela Casa Oswaldo Cruz. 

Não tive como deixar de dar continuidade à coluna anterior pelas questões que não me deixaram aquietar, principalmente depois que José Huguenin, autor do livro “Vidas Sertanejas”, me enviou o texto de João Zanetic, “Física e literatura: construindo uma ponte entre as duas culturas”, publicado no livro “História, Ciências e Saúde – Manguinhos”, publicado pela Casa Oswaldo Cruz. 

Tenho algum aprendizado em epistemologia, que é o estudo do conhecimento, adquirido durante o Curso de Pedagogia e o Mestrado em Educação. Por vezes é interessante adentrarmos em temas mais áridos, como esse, porque estão presentes em nossa vida e não nos damos conta disso. Até hoje me pergunto por que a física e a química não são estudadas desde o maternal, dado que estão intrinsicamente presentes no cotidiano. Aliás, estamos mergulhados nas palavras, nos números, nos fenômenos naturais, nas composições e reações químicas existentes nos seres vivos e brutos.

A aproximação entre as ciências e a literatura nos vai permitir melhor conhecer o mundo. O conhecimento científico está fundamentado na reflexão criteriosa e objetiva de fenômenos da natureza. É criteriosa porque se baseia em estudos metódicos de acordo com a área da ciência a que se refere. É objetivo porque é delimitada a um determinado tema a partir de um ponto de vista. Já a literatura pode nascer no conhecimento empírico, ou seja, aquele adquirido na experiência individual, no saber popular e na intuição. Como também ser inspirada pelos conhecimentos oferecidos pelas ciências.

Os romances, os contos, a poesia emergem no imaginário de pessoas que experimentam a aventura humana. A ciência surge da dúvida e da necessidade de dominar, através do conhecimento, os fenômenos naturais e humanos. Somos seres pensantes e precisamos do conhecimento para sobreviver, evoluir, viver com melhor qualidade e conquistar a felicidade. Tanto a literatura, especialmente as obras clássicas, como a ciência são fontes de saber. Uma reflexão moveu João Zanetic a produzir o texto sobre as relações entre a física e a literatura:  as obras clássicas, sejam filosóficas, textos científicos, poesias, contos e romances, foram construídas a partir da extrema sensibilidade dos seus autores que nos permitem estabelecer um diálogo inteligente com o espaço-tempo em que vivemos.

O intercâmbio entre a literatura e as diversas áreas do conhecimento seria de grande utilidade para interpretar o mundo, como também para transformá-lo. “O Capote, de Nicolai Gogol, une a literatura, com a filosofia, a sociologia, economia, a química, a física e tantas outras ciências. A delimitação espaço-tempo, o ponto de partida de todo texto, já traz um princípio físico por excelência.

Quando lemos um clássico da literatura Russa, por exemplo, como “Ana Karênina”, de Liev Tolstói, publicado há mais de cem anos, nos permite fazer uma viagem na dimensão espaço-tempo.

Está no imaginário o grande elo entre ciências e a literatura. Segundo Jacob Bronowski, em sua obra O Olho do Visionário”, A imaginação nos tinge de formas diferentes na ciência e na poesia. Na ciência ela organiza nossa experiência em leis, sobre as quais baseamos nossas experiências futuras. A poesia, porém, é outro modo de conhecimento, em que comungamos com o poeta, penetrando diretamente na sua experiência e na totalidade da experiência humana.”

 Ao se utilizarem de caminhos específicos e diferenciados, a ciência e a literatura nos oferecem conhecimentos universais. Eu tenho a ligeira impressão, como deseja João Zanetic, que, em breve, o mundo seja presenteado com escritores com veias científicas afloradas e cientistas com veias literárias manifestas, uma vez que cientistas e escritores são massivos querentes de conhecimentos porque não lhes bastam o que a vida lhes apresenta e oferece, querem ir além. São insatisfeitos. Procuram motivos que justifiquem a existência humana na Terra, inclusive a deles. Buscam entender as relações entre o humano com o Universo. Buscam ultrapassar os limites do conhecimento.

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Haverá entre a matemática e a literatura um encontro com o divino?

segunda-feira, 06 de fevereiro de 2023

Certa vez, já há alguns bons anos, quando fui à escola Municipal George Pfisterer, no Rio de Janeiro, falar com os alunos sobre um livro meu, conversei com um professor de matemática sobre religião na sala dos professores, que me disse que através da matemática era possível chegar a Deus. Nunca me esqueci dessa afirmação e sempre me pus a refletir a respeito. De todo modo, como educadora e escritora, só posso constatar que tudo o que vivo envolve palavras e números.

Certa vez, já há alguns bons anos, quando fui à escola Municipal George Pfisterer, no Rio de Janeiro, falar com os alunos sobre um livro meu, conversei com um professor de matemática sobre religião na sala dos professores, que me disse que através da matemática era possível chegar a Deus. Nunca me esqueci dessa afirmação e sempre me pus a refletir a respeito. De todo modo, como educadora e escritora, só posso constatar que tudo o que vivo envolve palavras e números. A meu ver, muito aquém do conhecimento das teorias matemáticas, os cálculos fazem parte dos processos mentais, como a força que devemos colocar nos pés para subir uma escada, digamos assim. Até o ato de consultar as horas envolve o pensamento matemático que está intrincado na cognição de tal maneira que nem percebemos as operações que fazemos, às vezes bem complexas. Se observamos um passe a gol, feito por um jogador de futebol durante uma partida, podemos concluir que o sucesso da jogada depende do pensamento matemático. Quantas equações e cálculos geométricos ele precisa fazer para que seu chute coloque a bola nos pés de outro jogador distante alguns metros?

Lemos, no Clube de Leituras Vivências, o livro “Vidas Sertanejas” de José Huguenin, editado pela Outramargem, em 2021. O autor, pessoa de simplicidade e tranquilidade admirável, é doutor em Física e professor universitário em Volta Redonda. Durante a leitura, eu não parava de me perguntar, como um físico pode adentrar na vida do sertanejo? Ser capaz de narrar com sensibilidade e realismo o sofrimento de quem viveu no sertão nos finais do século XIX. Essa pergunta também cutucou várias amigas do Clube que participavam da conversa com o autor no final da leitura do livro.

Ele nasceu em Cantagalo, terra de Euclides da Cunha e, por esse escritor, foi influenciado. Nosso Brasil tem histórias que nos machucam pela crueldade, injustiça e violência sofrida pelos povos do Norte e Nordeste. A sobrevivência do homem, especialmente com relação às mulheres, idosos e as crianças, surge como uma finalidade primeira para conquistar a dignidade do viver.

Mas, então, como um matemático, estudioso das ciências exatas, consegue tornar-se um escritor com a capacidade para entrar nos bosques da ficção e narrar a História do Brasil, para envolver e tocar um leitor, como eu, que não vive e nunca experimentou a severidade da dor causada pela impiedade de outros e pela aridez da natureza dos sertões brasileiros?

Quem escreve contos, romances, poesias penetra sem timidez nesses bosques, ambiente regido pelo imaginário. Por mais verossimilhança que exista com os fatos, o que se escreve jamais será exatamente tal qual o acontecer porque o texto é irreal por excelência, jamais ultrapassará os limites do papel ou da tela do computador. A literatura está no plano abstrato, e os fatos estão na concreticidade da vida.

Será que quem lida com os números tem a mesma sensibilidade de quem lida com palavras? Será que a exatidão das ciências matemáticas finca os pés do escritor na realidade, de modo a fazê-lo imaginar e criar ficção com fidedignidade aos fatos? Ou será que a matemática é a arte dos números, da mesma forma que a literatura é das palavras?

Ou será que o matemático que se torna escritor quer se encontrar com Deus?

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